O
que aconteceu em 11 de setembro de 2001? Resposta simples e histórica:
terroristas suicidas da rede Al Qaeda lançaram ataques nos EUA. Mas,
como diz Christopher Hitchens, “é muito provável que aqueles que aceitam
esta narrativa convencional são, pelo menos globalmente, a minoria”.
Estamos, de fato, na era da desinformação, dos atentados às verdades
mais elementares e da persistência das mais bizarras teorias
conspiratórias, alimentadas na Internet.
A descrença no convencional sobre o 11 de setembro nestes dez anos
não foi lugar-comum apenas no mundo muçulmano. Logo após os ataques,
ganharam vida em todas as partes as bizarrices sobre um complô do
governo americano e dos judeus (sempre eles). Havia a história que
quatro mil judeus tinham sido alertados sobre os atentados e não
apareceram para trabalhar naquele dia no World Trade Center,
inicialmente publicadas no jornal sírio Al Thawra. Existem as
fantasias detalhadas sobre o míssil que o próprio Pentágono disparou
contra o Pentágono. Na França, o livro de Thierry Meyssan sobre a
“mentira assustadora” do 11 de setembro foi best-seller, disparando esta
fantasia sobre o míssil ou um pequeno avião investindo contra o
Pentágono.
Arautos profissionais da paranóia na imprensa alternativa americana,
de direita e de esquerda, se uniram para denunciar as tramas.
Personagens folclóricos como o apresentador de rádio Alex Jones e o
repórter conspiratório Michael Ruppert tinham certeza sobre os planos
diabólicos do governo Bush para manufaturar os atentados. Tudo
elementar: era preciso um pretexto para invadir o Afeganistão e o
Oriente Médio, beneficiar a indústria petrolífera e de armamentos,
forjar um estado fascista que suprimisse as liberdades civis e
consolidar uma nova ordem mundial. Sacou? World Trade Center? Centro do
Comércio Mundial.
Logo depois dos atentados, a maluquice popular nos EUA até que estava
sob controle. Numa pesquisa no começo de 2002, apenas 8% acreditavam
que o governo Bush, então muito popular, mentia sobre o que acontecera.
Os números cresceram depois da guerra do Iraque diante do fato real de
que o governo Bush, de fato, enganara sobre as armas de destruição em
massa de Saddam Hussein. O número de céticos sobre a narrativa
convencional dos atentados do 11 de setembro saltou para 16% em 2004.
Escaramuças burocráticas em Washington e esforços do governo (como
acontecem em qualquer governo) para acobertar ou minimizar suas falhas
na prevenção dos atentados também alimentaram as teorias conspiratórias.
Políticos da ala mais esquerdista do Partido Democrata deram munição
para os conspiradores e Michael Moore com o seu documentário Fahrenheit 11 de Setembro
foi uma festa para os paranóicos ao martelar nas conexões da família
Bush com a Arábia Saudita e o clã Bin Laden. Por volta de 2007,
pesquisas revelararam que até 1/3 dos americanos duvidavam da narrativa
convencional sobre o 11 de setembro.
O tempo passou, Bush esvaneceu e Barack Obama assumiu a presidência. O
ódio a um presidente foi transferido a outro. Um parte dos
conspiradores sobre a verdade do 11 de setembro (os “truthers”)
inclusive migrou para a nova conspiração sobre as falsidades na vida
daquele “queniano” que mentira sobre ter nascido no Havaí. Hoje “só” uns
10% dos americanos não acreditam que a rede Al Qaeda tenha sido
responsável pelos atentados. Um alerta deve ser feito: o campo continua
fértil para teorias conspiratórias, de qualquer gênero, em tempos de
incerteza econômica nos EUA, falta de confiança nas lideranças políticas
e um descrédito sem precedentes das instituições, a destacar o governo
federal.
E já que não dá para ter um final feliz para esta história, vamos
para o mundo islâmico. Uma pesquisa de julho do Centro Pew confirma que,
uma década depois, existe ceticismo no mundo islâmico sobre os eventos
de 11 de setembro de 2001. A maioria dos muçulmanos acha inconcebível
que árabes tenham sido responsáveis pelos ataques (numa descrença que
inclui vergonha para assumir a verdade, crença no pacifismo da religião,
desconfiança na capacidade técnica de árabes realizarem os atentados,
preconceitos, antiamericanismo e antissemitismo). Dos 19 terroristas
suicidas, 15 eram sauditas, dois dos Emirados Árabes Unidos, um libanês e
um egípcio. A pesquisa englobou sete países e os territórios
palestinos. Em nenhum deles, sequer 30% aceitam que árabes realizaram os
ataques. Pior, muçulmanos na Jordânia, Egito e Turquia estão mais
céticos hoje do que há cinco anos.
Um dos dados mais preocupantes, aliás, é que esta pesquisa foi feita com a primavera árabe
em curso. E no mesmo revolucionário Egito que derrubou Hosni Mubarak
existe o nivel mais alto de negação da realidade, com 75% dos egípcios
registrando sua descrença que árabes tenham sido responsáveis pela obra
de destruição.
Eric Trager, um especialista em Oriente Médio da Universidade da
Pensilvânia, passou alguns meses no Egito, fazendo pesquisas e seu
relato sobre a percepção do 11 de setembro é desolador. Islamistas
encampam este revisionismo sobre o terror, pois reescrever a história é
fundamental para desviar a acusação de que sua ideologia motiva o
assassinato em massa. O ex-guia supremo da Irmandade Muçulmana, Mehdi
Akef, disse para o incrédulo Trager “que não existe o terror da Al
Qaeda, é uma expressão americana”. Na narrativa de Akef, os atentados do
11 de setembro representaram um ataque americano contra o Oriente Médio
e existe uma política islamista de autodefesa.
Líderes mais jovens da Irmandade Muçulmana gostam da tese que os
atentados do 11 de setembro, por sua sofisticação, só podem ter sido
obra da CIA ou do Mossad. Mesmo líderes seculares, socialistas ou
liberais no “novo Egito” também negam a responsabilidade da Al Qaeda.
Mustafa Shawqui, da Coalizão da Juventude Revolucionária, disse a Trager
que se tratou de maquinação para dominação global por interesses
imperiais. Até o vice-primeiro-ministro do governo provisório, Ali
ElSalmy, pisou na bola. Homem educado nos EUA, integrante do governo
Sadat nos anos 70 e ex-vice-diretor da Universidade do Cairo, ele disse
“não ter certeza sobre quem foi responsável pelos atentados”.
Treze anos depois dos atentados do 11 de setembro, é preciso impedir
novos ataques e ainda por cima estes atentados à verdade em países com
ou sem primavera árabe.
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