Nomes como José Dirceu, Chico Alencar, Fernando Gabeira e José Serra já
ultrapassaram o quociente em outras eleições, mas o fenômeno ficou
conhecido pejorativamente com "efeito Tiririca".
Há décadas o Congresso busca aperfeiçoar o sistema eleitoral, mas muitos
deputados logo se encantaram pelo distritão, a pior opção já
apresentada
Durante muitos anos, a discussão sobre a reforma do sistema eleitoral no
Brasil esbarrava na ausência de uma alternativa que conquistasse um
apoio razoável dos deputados federais. Esse quadro, entretanto, mudou na
legislatura que tomou posse em fevereiro desde ano.
Hoje, o distritão, um sistema eleitoral que nem sequer era mencionado no
debate há anos atrás, passou a ser opção preferencial da maioria dos
deputados.
A defesa do distritão está baseada em dois argumentos. O primeiro é que
ele é um sistema simples e fácil de ser entendido. Verdade. Podemos
fazê-lo com uma única frase: os mais votados do Estado se elegem. Numa
eleição para deputado federal em São Paulo, por exemplo, seriam eleitos
os 70 candidatos que tivessem mais votos.
O segundo argumento é que como cada candidato seria eleito apenas com os
seus votos, o que acabaria com o atual sistema de transferência de
votos entre os candidatos do mesmo partido (ou coligação).
No sistema eleitoral em vigor, os votos dos candidatos que concorrem na
mesma lista são somados. Ocasionalmente, alguns candidatos têm votação
expressiva, ultrapassam o quociente eleitoral e ajudam a eleger nomes
menos votados (muito raramente com votações baixíssimas).
Nomes como José Dirceu, Chico Alencar, Fernando Gabeira e José Serra já
ultrapassaram o quociente em outras eleições, mas o fenômeno ficou
conhecido pejorativamente com "efeito Tiririca".
Será que as eventuais vantagens trazidas por um sistema que é fácil de
entender e que acaba com as transferências de votos dos "puxadores de
legenda" são superiores aos problemas que ele provavelmente vai gerar?
Minha resposta é não.
O principal problema do distritão será seu efeito negativo nos já
combalidos partidos brasileiros. Imagine uma campanha em que os
eleitores não possam votar na legenda, em que os candidatos de uma mesmo
partido não tenham incentivo para cooperar entre si para atingir o
quociente eleitoral.
Imagine uma campanha na qual os dirigentes não tenham estímulo nenhum
para apresentar propostas partidárias para a sociedade, em que os
suplentes não sejam do mesmo partido do titular. Esse provavelmente
seria o formato, caso o distritão estivesse em vigor.
Diante das críticas de que que o distritão fragiliza ainda mais os
partidos é comum ouvir dos seus defensores um argumento surpreendente:
como ninguém confia mais nos partidos e os eleitores votam em nomes,
pouco importa que eles contem ainda menos nas eleições.
A lógica é esta: já que os partidos são fracos, vamos fazer uma reforma
para fragilizá-los ainda mais. Não seria justamente o oposto?
Quando se fala que o distritão é um bom sistema, pois garante a eleição
dos mais votados, cabe perguntar para onde vai o voto de milhões de
eleitores que votaram em nomes que não se elegeram. Seriam simplesmente
jogados fora.
Poucos eleitores sabem que usamos um sistema proporcional para eleger
deputados. Por isso, os votos dos candidatos de cada partido são somados
aos votos de legenda para se calcular quantas cadeiras cada partido
obterá. Na verdade, nesse sistema não há uma transferência indevida de
votos, mas, sim, um processo que soma os esforços dos nomes de uma mesma
legenda.
Assim, perdem o voto apenas os eleitores que votaram em partidos que não
elegeram nenhum nome. Nas eleições de 2014 para deputado federal esse
número foi muito reduzido na maioria dos Estados. Por exemplo, 4% em São
Paulo, 5% em Minas Gerais e 7% na Bahia.
No sistema eleitoral em vigor o eleitor pode não eleger "seu candidato",
mas o nome escolhido por ele necessariamente ficará em uma das
suplências. Se o eleitor votou na legenda, seu voto ajudou o partido. No
distritão, se o eleitor vota em um candidato perdedor, esse voto é
simplesmente ignorado na distribuição de cadeiras. Voto com mesmo
destino dos nulos e em branco.
Há quase duas décadas o Congresso busca uma alternativa para aperfeiçoar
o sistema eleitoral brasileiro. É uma pena que muitos deputados tenham
se encantado logo pelo distritão, que, a meu juízo, é a pior opção entre
as já apresentadas.
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