sexta-feira, 18 de outubro de 2019

Entenda o que é a prisão em segunda instância

Ministros do STF começaram a julgar, nesta quinta, 17, três ações que põem em xeque a constitucionalidade da execução da pena para condenados em segundo grau judicial; entenda como funciona

O Supremo Tribunal Federal começou a julgar nesta quinta, 17, o mérito de três ações que discutem a possibilidade de prisão em segunda instância. O entendimento sobre ser possível iniciar o cumprimento da pena a partir da segunda condenação já foi alterado duas vezes desde a Constituição de 1988, e se baseia no princípio constitucional da presunção de inocência.

O que é a presunção de inocência?

A presunção de inocência está prevista no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição do Brasil. “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.”

A prisão em segunda instância se trata de uma pena antecipada, explica João Paulo Martinelli, criminalista e professor de direito penal. “Trata-se de pena antecipada porque a Constituição Federal determina que a pena só pode ser aplicada após o trânsito em julgado, ou seja, quando não couber mais recursos.”

O princípio de presunção de inocência é considerado uma Cláusula Pétrea, ressalta Vera Chemim, advogada constitucionalista. “O princípio de presunção de inocência, assim como outros direitos fundamentais dos indivíduos, é considerado uma Cláusula Pétrea. Ou seja, não pode ser afrontado.”
Por que a segunda instância?

É somente nas instâncias ordinárias (Varas, Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais) que se analisa os fatos e as provas do caso, no mérito. Cabe ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo Tribunal Federal apenas a discussão quanto a questões legais ou constitucionais.

Argumentar pela prisão em segunda instância é dizer que já se esgotaram as possibilidades de análise probatória, diz Daniel Gerber, mestre em Direito Penal e Processual Penal. “Dessa forma, a presunção sobre um condenado em segunda instância já seria de culpa, não de inocência, eis que as provas analisadas levaram a uma determinada conclusão.”
Os ministros do STF já mudaram o entendimento

Desde a Constituição de 1988, o entendimento sobre a prisão em segunda instância já mudou duas vezes.

Até 2009, era o juiz quem decidia sobre a prisão, a depender de cada caso concreto. Naquele ano, ao analisar o pedido de habeas corpus para um réu que havia sido sentenciado em segundo grau, o Supremo decidiu, pela primeira vez, que a execução da pena ficava condicionada ao trânsito em julgado.

Em 2016, os ministros do STF voltaram a discutir a questão, mas reformaram o entendimento e autorizaram a prisão de um réu condenado por roubo qualificado após a condenação em segunda instância.

Em outubro do mesmo ano, a Corte manteve por 6 votos a 5 a possibilidade de execução de penas após a condenação pela Justiça de segundo grau.
Prisão em segunda instância é pilar da Lava Jato

A Operação Lava Jato se apoia na prisão em segunda instância. Os procuradores da força-tarefa do Ministério Público Federal avaliam que políticos, doleiros, empresários e ex-dirigentes da Petrobrás condenados estariam todos em liberdade, caso ainda predominasse o entendimento do Supremo anterior a 2016.

Atualmente, o Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), tribunal de apelação da Lava Jato, tem cerca de 100 condenados em segunda instância.

Nesta quinta, 17, a Procuradoria-Geral da República afirmou que reformar o entendimento do Supremo seria ‘um triplo retrocesso’.

“Um ponto divergente remete ao fato da constatação da impunidade decorrente dos inúmeros recursos em todas as instâncias e à necessidade de se atualizar o dispositivo constitucional de modo a buscar a atual concepção de justiça da sociedade”, diz a advogada Vera Chemin.

Para ela, o sentimento de impunidade causado pelos crimes revelados pela Lava Jato faz com que algumas pessoas defendam a necessidade de se atualizar o dispositivo constitucional.

Ministros do STF já se manifestaram para dizer que não há ‘influências externas’ no julgamento. É o caso, por exemplo, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso desde abril de 2018 no caso do triplex. Sua defesa já entrou com pedido de habeas corpus no Supremo, mas teve o apelo rejeitado.

O ministro Dias Toffoli, presidente da Corte, disse que o julgamento sobre prisão em segunda instância ‘não se refere a nenhuma situação em particular’. Já o ministro Marco Aurélio, por sua vez, afirmou que ‘nem Lula, nem Dallagnol devem influenciar o julgamento’.

Nenhum comentário:

Postar um comentário