Carlos Kennedy Witthoeft afirma que está "com a consciência em paz”.
Durante uma visita a São Carlos (SP), ele contou como conheceu a
fosfoetanolamina sintética, apontada por pesquisadores como um
tratamento alternativo para o câncer, por que quis doá-la e o que
aconteceu após ser preso e indiciado por falsificação de medicamento.
"Não tem como mensurar o que a gente sentia a cada pessoa que vinha
falar que estava curada", disse.
O catarinense relatou que conheceu a fosfoetanolamina em 2007. No dia 19
de março daquele ano, sua mãe teve uma hemorragia e exames apontaram
câncer no útero. “Ela tinha o coração fraco, não daria para fazer
cirurgia e nem quimioterapia, só radioterapia para dar mais qualidade de
vida, mas não a cura”, relatou.
Dois meses após o diagnóstico, quando amigos e familiares julgavam que a
idosa de 82 anos não aguentaria por muito mais tempo, ele soube que
pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) em São Carlos
distribuíam uma substância para a doença. Pediu o telefone do
coordenador dos estudos, o professor Gilberto Orivaldo Chierice, e
ganhou as cápsulas.
“Minha mãe não levantava mais da cama, dava duas, três mordiscadas no
pão e isso era a refeição do dia inteiro. Pedi para ela tomar o remédio
e, no terceiro dia, ela andou, desceu as escadas, foi à cozinha e disse:
‘Eu queria comer uma sopa’”, narrou Kennedy.
Ele afirmou que a melhora foi progressiva e, no 18º dia de consumo da
fosfoetanolamina, foi surpreendido. "Eu havia saído para ir aobanco e,
chegando em casa, uns 40, 50 minutos depois, a minha mãe estava no canto
do jardim segurando a enxada. Eu disse: 'Mãe, o que tu queres com a
enxada?'. E ela disse: 'Vou dar uma capinadinha'”.
Nesse dia, ele deu a mãe como curada e ligou para Gilberto perguntando
se poderia indicar as cápsulas, mas ouviu que a produção era
insuficiente para atender mais pacientes. “Minha mãe era conhecida em
Pomerode, pessoas viam a recuperação e perguntavam o que ela tinha
feito, se eu conseguia para elas. Eu queria que amigos pudessem tomar,
como podia dizer que não tinha como fornecer? Eu perguntei então se eu
podia produzir”, contou.
“O doutor Gilberto me perguntou se eu era químico e eu contei que não,
então ele disse que eu não poderia fazer, mas continuei insistindo
porque, se eu estivesse com câncer, queria que me dessem a fosfo. Disse:
‘O que eu tenho é muita vontade de ajudar essas pessoas, não adianta
ser químico e não ter vontade de ajudar’. Acho que esse argumento o
sensibilizou e ele perguntou quando eu poderia vir aprender”.
Kennedy viajou várias vezes para São Carlos e a cada visita passava
alguns dias na cidade. Ao todo, acredita que ficou cerca de quatro meses
aprendendo a ser um químico prático e a sintetizar a substância. Quando
finalmente conseguiu, começou a produzir as cápsulas em casa e a
distribuí-las de graça.
Prisão
Kennedy produzia as cápsulas na companhia da esposa, Aridina Gutknecht
Witthoeft, mais conhecida como Rita. Era ela que atendia as ligações e
conversava com as pessoas que pediam ajuda. “Quando o câncer aparece,
cai todo mundo, a família quer ajudar, o pai, o filho... Muitos ainda
recebem como sentença de morte. Ela atendia as pessoas e as confortava,
ficava uma hora, duas horas conversando. É preciso paciência, não é
fácil, mas ela tinha o dom para isso”.
No começo, em 2008, ele conciliava a produção com o trabalho como
representante comercial, mas a demanda cresceu. Sensibilizadas, várias
pessoas começaram a ajudar e a dedicação passou a ser exclusiva. “Cada
curado trazia em média três, quatro pessoas”, estimou.
Mas, no fim de junho deste ano, a produção cessou. Uma denúncia levou a
polícia ao imóvel e a Vigilância Sanitária apreendeu o material. Kennedy
passou 17 dias preso e foi indiciado por falsificação de medicamento,
uma vez que a fosfoetanolamina sintética não tem registro na Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
No dia em que saiu da cadeia com um habeas corpus, Aridina passou mal.
Ela foi internada e, após dias na unidade de terapia intensiva (UTI),
faleceu em 1º de agosto, em decorrência de um aneurisma.
“Até dois meses atrás eu morreria feliz. Não tem como mensurar o que a
gente sentia a cada pessoa que vinha falar que estava curada”, afirmou.
Entenda o caso
Na última segunda-feira (17), o G1 divulgou a existência de processos
envolvendo pacientes com câncer e a USP. Eles pedem que a universidade
continue fornecendo as cápsulas da substância, mas uma nova norma da
instituição impede a distribuição sem o registro na Anvisa.
Segundo a agência, o registro de um novo medicamento só pode ser
solicitado após testes clínicos e os pesquisadores da USP afirmam que a
substância foi testada em um hospital em Jaú, mas a parceria acabou e
eles precisam que uma nova unidade de saúde aceite concluir o estudo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário